quinta-feira, 29 de abril de 2010

Barton Fink - DelĂ­rios de Hollywood (1991)

Em 1990, antes de finalizar o roteiro de "Ajuste Final", Ethan Coen e Joel Coen passaram por um bloqueio criativo, tal qual Fellini descreveu em sua obra-prima "8 1/2". A dupla entĂŁo aproveitou a dificuldade para finalizar o projeto inicial, para escrever um outro filme. Surgia entĂŁo "Barton Fink", filme em que os irmĂŁos Coen retratam a luta de um homem, contra as barreiras intelectuais de sua mente.

Fink (interpretado muito bem por John Turturro) é um homem solitårio, que vive à margem da sociedade. Sua intelectualidade não o deixa contemplar as coisas simples da vida. Aclamado em Nova York, por suas peças de contexto social, logo recebe uma proposta irrecusåvel para escrever filmes em Hollywood, em uma produtora de filmes B.
O produtor do estĂșdio lhe recebe em seu escritĂłrio e promete "mundos e fundos" para o tĂ­mido Barton Fink, caso ele escreva um simples filme sobre luta.

Incomodado e totalmente inapto para função que lhe fora incubida, Fink se sente mais sozinho no caloroso cĂșbiculo de um hotel. Sua cabeça Ă© incapaz de escrever algo linear, sem conteĂșdo mais profundo. AtĂ© que conhece o simpĂĄtico Charlie Meadows (John Goodman), um simplĂłrio corretor que mora no quarto ao lado. O homem se torna uma espĂ©cie de figura fetiche para Fink, que o sintentiza como um cidadĂŁo comum. Diferente de seu auto-conceito que o define como uma pessoa mergulhada em abstraçÔes mentais. Sua capacidade para encontrar bloqueios criativos Ă© a grande dificuldade que o tenta na hora de escrever o famigerado roteiro. Logo o recĂ©m conhecido amigo, torna-se seu maior confidente e pessoa de confiança.

A pressĂŁo para que o escritor finalize o filme aumenta gradativamente. Sua falta de criatividade leva-o a conhecer W.P.Mayhew (John Mahoney), um escritor consagragrado, que como Fink fora sugado pela indĂșstria cinematogrĂĄfica e se tornou bebum. Sua secretĂĄria e amante, Audrey Taylor (Judy Davis) tenta ajudar Mayhew em sua batalha diĂĄria contra o vĂ­cio que o acomete. Fink se interessa pela moça, e a pede para que ela o ajude a construir o roteiro de seu filme.

Os fatos se intensificam, quando o protagonista desperta ao lado de Audrey assassinada brutalmente. Além disso, Fink descobre que seu melhor amigo Charlie, na verdade é um psicopata, e que sua aparente simplicidade é uma mera ilusão.

Ethan e Joel Coen deixam claro nesse filme, suas dificuldades durante o processo de criação de um escritor. Como uma crescente, a pelĂ­cula torna-se mais complexa e poĂ©tica. A dupla nĂŁo se inspira em belas imagens para retratar idĂ©ias, mas sim em fatos que aparentemente simples. Tal como um papel de parede descolando, ou um quadro praiano que Ă© constantemente observado por Fink. É como se o principal personagem fosse o alter-ego dos irmĂŁos Coen.

De fato "Barton Fink" evidencia a fuga de seu protagonista que é incapaz de escrever um roteiro banal, devido ao fato dele perseguir uma idéia mais profunda. Tal ideologia é vista como um vício, na qual Fink tenta utopicamente se desvencilhar. E esse fator não lhe persegue apenas na hora de escrever, mas sim em toda sua vida.

"Barton Fink" é um exemplo de cinema de qualidade, com performances estupendas de Turturro e Goodman. Judy Davis também convence com o papel da ajudante de Mayhew, em um personagem chave da trama, cuja representatividade simboliza a ilusória fulga da mente dos escritores.

O dilema entre a banalidade ou a complexidade de uma estrutura narrativa no cinema, espelha a complexa trilha da dupla Ethan e Joel, que beiram o artĂ­stico e o mainstream ao mesmo tempo. Fink Ă© a essĂȘncia dos irmĂŁos que atĂ© o começo da dĂ©cada de 1990, eram pouco conhecidos por suas obras pessoais. "Barton Fink" consagrou os irmĂŁos Coen com a Palma de Ouro em Cannes e trĂȘs indicaçÔes ao Academy Awards.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Nashville (1975)

No ĂĄpice do escĂąndalo Watergate, que envolveu o alto escalĂŁo do poder dos EUA, surgia uma obra que criticava a conturbada sociedade americana do perĂ­odo. A "Era Nixon" mexera com a auto-estima do tĂŁo patriĂłtico povo americano, ainda mais apĂłs o desfecho frustrante na Guerra do VietnĂŁ.

"Nashville" trata da alienação da população e de suas escolhas erradas para o poder do paĂ­s. A pelĂ­cula de 1975 mescla temas polĂ­ticos, sociais e atĂ© religiosos, usando como pano de fundo uma das mais americanas cidades dos EUA. Localizada no Tennessee, Nashville Ă© um dos maiores pontos de referĂȘncia para a mĂșsica popular da terra do Tio Sam.

Robert Altman, jĂĄ tinha chamado a atenção do pĂșblico e principalmente da crĂ­tica, no final dos anos 60 e começo dos 70. Com "Nashville" o cineasta produziu o maior e melhor projeto de sua filmografia quase impecĂĄvel (dirigiu bombas como "Popeye" e "Pret a Porter"). Nessa pelĂ­cula, Altman desempenhou seu icĂŽnico poder sobre atores, mostrando que ele de fato foi um dos grandes cineastas nesse quĂ©sito. Ele era capaz de tranformar canastrĂ”es em grandes artistas. Lily Tomlin, na Ă©poca foi indicada ao Oscar de melhor atriz por sua bela atuação nesse filme. Outro mĂ©rito de Altman, era a forma sutil em que o diretor mostrava as mazelas sociais dos personagens. Em nenhum momento o filme joga de forma contundente os problemas sofridos para o espectador.

A cena inicial de Nashville, por exemplo, se passa dentro de um estĂșdio local. Em uma sala Ă© gravado um dissonante "folk", interpretado por Henry Gibson (morto recentemente). JĂĄ no ambiente ao lado, um excitante "gospel" Ă© entonado por um agitado e dançante coral negro. Uma jornalista britĂąnica da BBC (interpretada magistralmente por Geraldine Chaplin) tem o trabalho de registrar o movimento de Nashville para um documentĂĄrio da aclamada emissora. É dela as primeiras frases brilhantes do filme, onde ela compara os mĂșsicos negros Ă  antigas tribos africanas. De forma sucinta, Altman critica os falsos valores norte-americanos, advindos da "pĂĄtria mĂŁe".

AlĂ©m do racismo, o filme aborda o famoso "American Dream". Na ocasiĂŁo da pelĂ­cula, Nashville recebe Barbara Jean (Ronee Blakley), uma das mais prestigiadas cantoras de Country dos EUA. Seu carisma perante fĂŁs que a clamam como uma deusa, Ă© usado em prĂł de uma campanha presidencial. Contudo seu marido, que tambĂ©m Ă© agente da artista, nĂŁo vĂȘ com bons olhos a inclusĂŁo da imagem da cantora em uma campanha polĂ­tica.

Inspiradas na cantora, vĂĄrias mulheres da cidade , e fora tambĂ©m, tentam em vĂŁo se apresentar afim de tornassem estrelas. É o caso da desafinada Suellen Gay (Gwen Welles) que na tentativa constrangedora de mostrar seu "talento", despe-se para dezenas de homens que sĂł a queriam cantando para ve-lĂą nua. Ou a de uma persistente loira, que no trĂĄgico desfecho de "Nashville" consegue enfim mostrar o poder de sua voz, e assim reascender a estima dos desmazelados e excluĂ­dos da sociedade norte-americana.

A mĂșsica "I´m Easy" do atĂ© entĂŁo galĂŁ, Keith Carradine levou a Ășnica estatueta do Oscar de 1976, que naquele ano fora dominado pelo tambĂ©m excelente "Um Estranho no Ninho". Composta e interpretada pelo prĂłprio ator, a mĂșsica tornou-se um sĂ­mbolo desse filme que contem dezenas de mĂșsicas boas de Folk e Country. A cena em que ela Ă© entoada, tambĂ©m Ă© majestosa. O cantor Tom Frank (Carradine), convida Linnea (Lily Tomlin) a vĂȘ-lo tocar em um clube noturno local. Mesmo arrancando o suspiro de vĂĄrias garotas mais jovens, o artista se apaixona pela simplĂłria mulher de Nashville que se dedica ao Gospel e a seus dois filhos deficientes auditivos.

AliĂĄs Ă© vĂĄlido ressaltar que os desempenhos musicais de "Nashville" saltam aos olhos. Muitas mĂșsicas sĂŁo deliciosas como a jĂĄ citada "I´m Easy" e "It Don't Worry Me", ambas compostas por Keith Carradine. As apresentaçÔes de Barbara Jean tambĂ©m sĂŁo de Ăłtima qualidade, contrabalançando Ă s histĂ©ricas Connie White (Karen Black) e a citada Suellen Gay, que arrancam propositais desempenhos de mal gosto.

Com essa mistura de temas sociais e mĂșsica, Altman usou de sua convencional sutileza para dirigir uma das crĂ­ticas mais bem realizadas da sociedade estadunidense. "Nashville" Ă© considerado em muitas listas ao redor do mundo, como um dos 100 melhores filmes da histĂłria. AtravĂ©s dos tempos, esse filme criou seguidores nos EUA, sendo o aclamado Paul Thomas Anderson (MagnĂłlia e Sangue Negro), um dos seus fiĂ©is seguidores. Confira.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

PRÓXIMAS ESTRÉIAS DE BLOCKBUSTERS

Com o fim de Abril, as produtoras lançam suas principais cartadas para arrecadar milhĂ”es nas bilheterias. Portanto Ă© nesse perĂ­odo em que os blockbusters mais esperados estreiam. Infelizmente a originalidade Ă© deixada de lado, pois os supostos sucessos sĂŁo refilmagens, adaptaçÔes de quadrinhos e games, ou histĂłrias de Ă­cones jĂĄ contadas anteriormente nas telas. Isso se nĂŁo for continuação de uma franquia de sucesso. Todas essas fĂłrmulas estarĂŁo brevemente em um cinema prĂłximo a vocĂȘ.

30 de Abril-A NIGHTMARE ON A ELM STREET
Esperada refilmagem para os fĂŁs do icĂŽnico vilĂŁo Freddy Kruger, "A Nightmare on a Elm Street" tem seu protagonista estrelado pelo medonho e competente Jackie Earle Haley. O ator que jĂĄ foi indicado ao Oscar de melhor ator coadjuvante por "Pecados Ă­ntimos", demonstrou empolgação com o produto final, que promete violĂȘncia, alĂ©m de revelar a origem da demoniaca entidade de Kruger.

07 de Maio-IRON MAN 2
Após o divertido desfecho de "Iron Man", Tony Stark agora tem que lidar com sua fama de super-herói, e consequentemente com vilÔes perigosos, tal como Whiplash, interpretado pelo cultuado Mickey Rourke. Além da aguardada tecnologia tridimensional que promete bater recordes do verão 2010, o elenco do filme estå lotado de estrelas; Robert Downey Jr., Scarlett Johansson, Samuel L.Jackson, Gwyneth Paltrow, Sam Rockwell, Don Cheaddle e o jå citado Rourke.

14 de Maio-ROBIN HOOD
Russell Crowe, apesar de ter envelhecido bastante nessa dĂ©cada, tem sua Ășltima oportunidade como protagonista em "blockbusters" no esperado "Robin Hood". Apesar da dupla Crowe e Ridley Scott jĂĄ terem tido sucesso com o bom "Gladiador", a histĂłria Ă© bem conhecida e terĂĄ uma censura baixa (13 anos), jĂĄ que o cineasta quer que o pĂșblico nĂŁo se restrinja somente Ă  maiores de idade. A baixa sanguinolĂȘncia pode ter efeitos negativos no produto final de "Robin Hood".

21 de Maio-SHREK FOREVER AFTER
Após a decepção pelo terceiro filme da saga do ogro verde, a Dreamworks Animation ainda aposta em Shrek. O quarto filme não é tão esperado, pois a decepção com o terceiro foi muito grande. Contudo os produtores garantem muita diversão e humor, somados à tecnologia tridimensional que estå levando muitas pessoas ao cinema.

28 de Maio-PRINCE OF PERSIA-THE SANDS OF TIME
O carisma de Jake Gyllenhaal somado ao sucesso do game homÎnimo, poderå render um bom dinheiro à Walt Disney, produtora do longa. Mike Newell que jå dirigiu um filme de "Harry Potter" também estå à frente dessa película, que tem no elenco a bela Gemma Arterton, além do onipresente Ben Kingsley e o talentoso Alfred Molina.

TOP 5-EUA

Fim de cinema disputado nos cinemas norte-americanos. Com o começo da primavera no hemisfĂ©rio norte e a aproximação das famigeradas fĂ©rias de verĂŁo, as produtoras lançam desde o começo de Abril suas "cartas na manga". A Dreamworks por exemplo voltou a ficar em primeiro lugar com "How To Train Your Dragon", uma animação em 3-D muita boa do mesmo estĂșdio de Shrek. JĂĄ "Kick-Ass" ficou em segundo por pouco menos de U$200 mil. A pelĂ­cula adaptada do quadrinho homĂŽnimo Ă© comparada com "Superbad" misturado com "Kill Bill" e candidato Ă  cult favorito.

Na terceira colocação ficou Steve Carrell e Tina Fey na comĂ©dia "Date Night". A dupla de comediantes que faz muito sucesso na televisĂŁo com suas respectivas sĂ©ries, emplacou a primeira posição entre os mais vistos na Ășltima semana. JĂĄ o remake desnecessĂĄrio de "Death at a Funeral" (filme inglĂȘs de 2007) ficou em uma quarta posição surpreendente, jĂĄ que a crĂ­tica detonou o filme de Neil La Bute.

A grande decepção do ano até agora ficou por conta da quinta colocação. "Clash of the Titans" usufrui da pior maneira possível da tecnologia 3-D. Segundo espectadores que jå viram a película, a mitológica história possui dezenas de falhas na reprodução do sistema tridimensional, deixando seus personagens deformados e desproporcionais. Vale lembrar qu o filme tem previsão de estréia no Brasil no dia 21 de Maio.

Confira os nĂșmeros abaixo.

1-) How to Train Your Dragon
Jå arrecadou: U$159 milhÔes
2-) Kick-Ass
Arrecadou na estréia:U$19,8 milhÔes
3-) Date Night
Jå arrecadou:U$49.2 milhÔes
4-) Death at a Funeral
Arrecadou na estréia:U$17 milhÔes
5-) Clash of the Titans
Jå arrecadou: U$133 milhÔes

quinta-feira, 15 de abril de 2010

INDICADOS À PALMA DE OURO EM CANNES 2010


Nessa quinta-feira foi revelado os indicados Ă  famigerada Palma de Ouro em Cannes, principal festival de cinema do mundo. A festa desse ano vai contar com Tim Burton presidindo o jurĂ­. O famoso cineasta vai ajudar Ă  escolher o melhor filme dentre os indicados. Diferentemente da Ășltima edição, nesse ano os indicados nĂŁo sĂŁo tĂŁo consagrados. Dentre os mais conhecidos e premiados estĂŁo Abbas Kiarostami (Copie Conforme), Takeshi Kitano (Outrage), Mike Leigh (Another Year), Alejandro Gonzales Innaritu (Biutiful), Doug Liman (Fair Game) e Bertrand Tavernier (La Princesse de Monptpensier). Ja na premiação "Un Certain Regard", Jean Luc Godard (Film Socialisme), Manoel de Oliveira (Anjelica) e Hideo Nakta (Chatroom), estĂŁo entre os indicados.

Nesse ano o Brasil não repetiu o feito de anos anteriores, com filmes representantes em alguma premiação de Cannes. O festival vai ocorrer na Riviera Francesa entre os dias 12 e 23 de Maio, com abertura do aguardado "Robin Hood" de Ridley Scott. Woody Allen também estarå em Cannes para divulgar seu novo filme, "You Will Meet A Tall Dark Stranger ". Confira os indicados na íntegra.

In competition
Tournee (Mathieu Almaric)
Des Hommes et des Dieux (Xavier Beauvois)
Hors la loi (Rachid Bouchareb)
Biutiful (Alejandro Gonzales Innaritu)
A Screaming Man (Mahamat-Saleh Haroun)
Housemaid (Im Sangsoo)
Copie Conforme (Abbas Kiarostami)
Outrage (Takeshi Kitano)
Poetry (Lee Chang-dong)
Another Year (Mike Leigh)
Fair Game (Doug Liman)
You, My Joy (Sergei Loznitsa)
La Nostra Vita (Daniele Luchetti)
Utomlyonnye Solntsem 2 (Nikita Mikhalkov)
La Princesse de Monptpensier (Bertrand Tavernier)
Uncle Boonmee Who Can Recall His Past Lives (Apichatpong Weerasethakul)

Un Certain Regard
Blue Valentine (Derek Cianfrance)
Anjelica (Manouel de Oliveira)
Heartbeats (Xavier Dolan)
Los Labios (Ivan Fund and Santiago Loza)
Simon Werner a Disparu... (Fabrice Gobert)
Film Socialisme (Jean-Luc Godard)
The City Below (Christoph Hochhausler)
Rebecca H (Lodge Kerrigan)
Adrienn Pal (Agnes Kocsis)
Udaan (Vikramaditya Motwane)
Tuesday, After Christmas (Radu Muntean)
Chatroom (Hideo Nakata)
Aurora (Cristi Puiu)
Ha Ha Ha (Hong Sangsoo)
Life Above All (Oliver Schmitz)
Octubre (Daniel Vega)
R U There (David Verbeek)
Chongqing Blues (Xiaoshuai Wang)


Naomi Watts e Sean Penn contracenam juntos novamente em "Fair Game" de Doug Liman

Takeshi Kitano dirige e protagoniza "Outrage", seu mais novo filme sobre mĂĄfia japonesa.

segunda-feira, 12 de abril de 2010

UM CORPO QUE CAI (1958)


Porque "Vertigo" nĂŁo fez sucesso entre crĂ­tica e pĂșblico no ano em que foi lançado? Porque a atuação de Kim Novak nĂŁo teve sua merecida homenagem por ser umas das mais intensas da histĂłria da sĂ©tima arte? E porque a icĂŽnica trilha sonora de Bernard Herrman, para essa pelĂ­cula Ă© apenas restrita Ă  admiradores de Hitchcock, diferentemente da popular trilha que compĂŽs em "Psicose"? Todas respostas sĂŁo resumidas em um ponto. Devido a genialidade de um homem que a frente de seu tempo, criou um clĂĄssico absoluto da sĂ©tima arte.

Desde as incríveis imagens em espiral do crédito inicial, até o surpreendente pesadelo do personagem de James Stewart. O roteiro envolvente conta a história de John Scottie, um detetive recém aposentado, graças a sua acrofobia (medo de altura). Durante uma perseguição, Scottie fica pendurado no telhado e tenta ser socorrido por um colega policial. Fatalmente o homem perde o equilíbrio e morre. O detetive então se sente culpado pela morte do policial que tentou lhe ajudar. Contudo, na ociosidade de sua aposentadoria, Scottie consegue um bico, com um antigo conhecido de faculdade. Gavin Elster (Tom Helmore) propÔem ao recém aposentado detetive, que ele siga sua bela esposa Madeleine (Kim Novak), afim de descobrir o que a moça anda fazendo enquanto ele estå ausente. Segundo Elster desconfia, sua esposa estå possuída por Carlota Juarez, bisavó da mulher.

Mesmo cĂ©tico com as palavras do conhecido, Scottie resolve investigar a mulher e portanto passa a segui-la. A primeira vista, a esposa de Elster bem transborda excentricidade com suas constantes visitas a um cemitĂ©rio, um museu e um hotel. Os pontos apresentam significativos aspectos em comum; em todos locais mencionados, Carlota Juarez estĂĄ presente de alguma forma. No cemitĂ©rio Madeleine visita a sepultura da bisavĂł; no museu ela passa horas admirando o retrato pintado de Carlota; e por fim, se hospeda no hotel que antes era residĂȘncia de sua admirada falecida.

ApĂłs uma tentativa de suĂ­cidio na Baia de SĂŁo Francisco, Scottie resgata Madeleine da ĂĄgua, e acaba se apaixonando pela bela moça. A mulher passa a ficar mais angustiada e nĂŁo para de repetir seus atordoantes devaneios ao homem que acabara de conhecer. Subitamente a paixĂŁo se torna recĂ­pocra, atĂ© que um dia em um ato de angĂșstia, Madeleine se joga de uma torre. Devido sua fobia, Scottie nĂŁo consegue segui-la atĂ© o alto da construção, e pela segunda vez acaba se responsabilizando pela morte de alguĂ©m. Deprimido o homem Ă© internado em estado de choque, e conta somente com a visita de sua admiradora nĂŁo muito secreta Midge (Barbara Bel Geddes).

Nesse ponto Hitchcock cria uma linha para dividir o segundo personagem de Kim Novak. Surge entĂŁo Judy Barton, uma mulher idĂȘntica Ă  Madeleine. Desconfiado e obsessivo, Scottie a persegue afim de descobrir sua verdadeira identidade, jĂĄ que a semelhança com a falecida amada Ă© extrema. Nesse ponto o espectador descobre metade do mistĂ©rio do filme. Hitchcock entĂŁo deixa o suspense um pouco de lado, para focar a obsessĂŁo que Scottie tem pela sĂłsia de Madeleine. Ele lhe compra novas roupas e pede para que ela pinte o cabelo de loiro, jĂĄ que Judy Ă© morena. Apaixonada pelo ex-detetive, porĂ©m frustrada e enciumada com Madeleine, Judy obedece rigorosamente aos pedidos do amado.

Ok, para quem nĂŁo viu o filme, acredito que o ponto final desse texto seja aqui, pois a partir de agora escreverei alguns SPOILERS que podem acabar com a surpresa dessa obra;

Scottie descobre que Judy Ă© a mesma pessoa que Madeleine, quando ele vĂȘ o colar vermelho que era de Carlota Juarez. A jĂłia era um presente que Gavin tinha dado Ă  moça, jĂĄ que Judy nĂŁo era sua mulher verdadeira, e sim uma sĂłsia de sua esposa, na qual ele a matara. Para forjar uma testemunha de suicĂ­dio, Gavin contratou Scottie jĂĄ sabendo de sua fobia por altura. Por isso usara a alta torre de uma igreja espanhola para finalizar o crime perfeito. Lançou sua verdadeira esposa de cima da construção, para simular um falso suicĂ­dio, sabendo que Scottie jamais subiria atĂ© o fim.

Talvez o desfecho de "Um Corpo que Pai" seja o melhor climax que o cinema jĂĄ produziu em mais de cem anos de existĂȘncia. O diĂĄlogo angustiante entre Scottie e Judy revelando toda a trama por trĂĄs de Madeleine, acaba com um caloroso abraço e um suposto perdĂŁo por parte do ex-detetive. AlĂ©m de sua cura para a acrofobia que lhe acometia.

Eis que surge um dos mais icĂŽnicos e misteriosos finais do cinema, quando a sombra de uma freira aparece para o casal. Judy se assusta com a sombria silhueta e fatalmente cai do mesmo local onde supostamente Madeleine teria se jogado.

Hitchcock magistralmente trata o filme com cuidados e detalhes dignos de um mestre sistemĂĄtico. Seu fascĂ­nio por espiral pode explicar algumas cenas da pelĂ­culas, como o penteado de Madeleine que coincide com o do quadro de Carlota, e o lance de escadas da torre onde ocorre os fatos mais importantes do filme, atordoando os espectadores (de forma positiva Ă© claro).

Cada cinéfilo com sua interpretação para o simbólico desfecho. No meu ponto de vista acredito que a película antes de tratar de um crime ou um romance, mostra o transtorno de um homem (tanto é que o nome original do filme é "vertigem"). Tal enfermidade demonstrada pelo protagonista se resume ao seu medo diante à altura. Intrépido nos segundos iniciais da trama, o detetive logo se acovarda diante de seu medo. Jå nos segundos finais, sua fobia se esvaira e traz a tona novamente aquele heróico detetive que perseguia marginais fugitivos. Hitchcock simplesmente tratou de mostrar o transtorno de Scottie, pontuado por um intrigante história sobre uma misteriosa mulher. A espiral, que remete tontura devido a vertigem, desnorteia o protagonista da trama, mesmo em momentos que não estå nas alturas. Pateticamente, Judy é morta de forma metafórica, tal qual a torturosa acrofobia de Scottie. O sino tocado pela freira representa a redenção e cura do personagem.

Como dezenas de teorias, tracei a minha, independente se estiver certa ou nĂŁo. Apenas sei que para uma obra ser considerada de qualidade, antes de mais nada precisa cativar seu apreciador, mesmo apĂłs o tĂ©rmino da experiĂȘncia. "Um Corpo que Cai" Ă© uma prova concreta de que esse tipo de arte existe e transcede Ă s telas de cinema, para o imaginĂĄrio do espectador. Isso Ă© definição para obra-prima.

sĂĄbado, 10 de abril de 2010

AMANTES (2008)


"Amantes" é um exemplo de um roteiro simples e bem articulado, que nas mãos de um bom cineasta, pode se transformar em uma película maior do que deveria. Certamente James Gray é um diretor do segundo escalão hollywoodiano, dirigindo pequenos filmes com grandes astros. "Os Donos da Noite" (2007) e "Caminho sem Volta" são duas de suas películas estreiadas por grandes atores do cinema estadunidense. Em "Amantes", Gray conta com talento estimåvel de Joaquin Phoenix, que desde então nunca mais atuou, e da regular Gwyneth Paltrow que estå muito bem nesse longa. Jå a quase desconhecida Vanessa Shaw, atua muito bem deixando boas impressÔes para projetos futuros.
A histĂłria como eu escrevi acima Ă© bem simples. Leonard (Phoenix) Ă© um trintĂŁo judeu que trabalha na lavanderia de seu pai. Deprimido, o homem tenta se afogar logo no inĂ­cio do filme afim de dar um tĂ©rmino em sua sofrida vida. ApĂłs desistir do suĂ­cidio, Leonard conhece Sandra (Shaw), uma jovem e bonita moça que aparentemente se interessa pelo homem. Contudo Leonard se apaixona pela vizinha, uma assistente advocatĂ­cia chamada Michelle (Paltrow). Se tornam amigos e começam a sair juntos, atĂ© que Leonard descobre que ela gosta de um outro homem. O problema Ă© que ele Ă© casado e tem filhos. Frustrado o homem tenta se aproxima de Sandra, mulher que aparentemente se interessa por ele mais do que sua vizinha. Contudo Michelle o procura incenssantemente afim de pedir conselhos amorosos ao apaixonado amigo. Leonard tenta de todas as formas se desvencilhar da bela mulher, contudo ele se sente cada vez mais atraĂ­do. Ao mesmo tempo engata um relacionamento com Sandra. O namoro e possĂ­vel casamento entre eles, pode estabelecer uma junção entre as lavanderias dos pais do casal.ApĂłs um incidente em que Michelle perde um bebĂȘ, Leonard busca alternativas para ajuda-la. EntĂŁo a mulher decide se separar do homem que tanto ama, deixando seu apaixonado amigo em um dilema.

Claramente o roteiro mostra os anseios e erros que um desiludido homem apaixonado pode cometer pelo amor platĂŽnico. Ao mesmo tempo, deixando uma real oportunidade de lado para se aventurar em um desconhecido caminho. Mesmo parecendo piegas, "Amantes" Ă© um romance pouco meloso e bastante realista, tratando da eterna questĂŁo do "amor errado".

Apesar de nĂŁo ser fĂŁ de filmes romĂąnticos, devo afirmar que torci muito pelo protagonista da trama. Phoenix, doa-se ao personagem, tranformando-o em uma pessoa comum e complexa. A densidade de sua atuação, veio da liberdade que o cineasta James Gray, deu ao ator para improvisar quando quisesse. É incrĂ­vel como pequenos gestos e atos, humanizam tanto o protagonista da trama. O ritmo lento e para muitos arrastados, tambĂ©m determina o Ăłtimo resultado final de "Amantes", contendo uma bela e rica fotografia, alĂ©m de uma trilha sonora eclĂ©tica e de qualidade.

O filme foi indicada Ă  Palma de Ouro em Cannes e ao prĂȘmio de melhor filme estrangeiro no CĂ©sar. Em ambas premiaçÔes, Gray nĂŁo levou nada. Contudo "Amantes" nĂŁo serĂĄ brevemente esquecido, pois jĂĄ tem a merecida honra de ser um dos melhore filmes romĂąnticos da dĂ©cada.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

12 HOMENS E UMA SENTENÇA (1957)

"12 Homens e Uma Sentença" Ă© mais do que uma bela obra-prima sobre justiça. O filme de estrĂ©ia de Sidney Lumet Ă© uma revisĂŁo antropolĂłgica da sociedade estadunidense da metade do sĂ©culo XX. O filme retrata um jĂșri popular, que tem a ĂĄrdua tarefa de dar a sentença Ă  um pobre jovem que Ă© acusado de assassinar seu pai. A prĂ­ncipio todos concordam em acusa-lo, com exceção do Jurado 8 (Henry Fonda magnĂ­fico). Sozinho, o homem contraria a posição dos demais jurados, mesmo nĂŁo se baseando em um argumento forte. O simples fato de discutir sobre o crime, para o Jurado 8, Ă© um ato nobre no qual ele acredita que o acusado tem direito.

Ao expor doze homens comuns em uma situação delicada, o roteirista Reginald Rose criou ícones que representam personalidades e facetas comuns do povo norte-americano. Temos o fanåtico por beisebol, o Jurado 7 (Jack Warden) que tenta limitar seus argumentos, afim de assistir ao jogo de seu time. Jå o Jurado 10 (Ed Begley), é um velho carrancudo que não prioriza o crime em si, mas sim seu preconceito em relação aos pobres. O Jurado 3 (Lee J.Cobb) se apoia com convicção da culpa do acusado, tanto quanto no seu orgulho e na måscara de durão diante do abandono de seu filho. Além deles, o filme mostra a faceta do idoso, que no caso do Jurado 9 (Joseph Sweeney) é um homem cheio de mågoas, mas dono de uma perspicåcia incrível e fundamental para o decorrer da trama.

Lumet aproveita a claustrofĂłbica sala, com planos de cĂąmeras inusitados. Hora algum personagem Ă© "expremido" em um Ăąngulo fechado, hora todos os personagens sĂŁo vistos ao mesmo tempo em um plano aberto. É interessante notar, como pequenos detalhes na pelĂ­cula fazem diferença e podem mudar o foco do filme. Por exemplo, no começo do filme a sala em que ocorre toda a trama estĂĄ muito quente, deixando os jurados totalmente suados e incomodados. É como se a tarefa de fazer parte de um jĂșri fosse algum castigo. No meio da trama, o Jurado 7 consegue ligar o ventilador que atĂ© entĂŁo nĂŁo funcionava, aliviando o calor dos homens enclausurados no local. A partir desse ponto, os personagens levam o caso do garoto com maior afinco e passam a olhar as possibilidades com maior atenção. Seria um mero acaso, se nĂŁo fosse tĂŁo bem elaborado pelo roteirista e bem estruturado por Lumet. Detalhe esse, quase raro em filmes da Ă©poca.

Além dos belíssimos planos, dos detalhes e realismos do roteiro e da atmosfera densa, "12 Homens e uma Sentença" também é um show de atuaçÔes. Destaque para a simplicidade de Henry Fonda; a raiva repremida de Lee J.Cobb; a sabedoria e serenidade de Joseph Sweeney; a forma carrancuda de Ed Begley; George Voskovec, um dos membros do jurí que é vítima de xenofobia pelo Jurado 7. Sua sabedoria estrangeira é tão notåvel quanto sua honestidade e dever de cidadão justo.

O filme que recebeu uma bela refilmagem homĂŽnima de 1997, Ă© uma grande obra do cinema, que nĂŁo envelheceu nada nesses 53 anos desde sua estrĂ©ia. AlĂ©m de uma crĂ­tica Ă  sociedade norte-americana, e ao poder da justiça que um homem comum pode exercer, "12 Homens e uma Sentença" Ă© um belo suspense dramĂĄtico no qual o prĂłprio Henry Fonda teve a honra de produzir. Por sinal seu primeiro e Ășnico filme como produtor. OBRA-PRIMA.
 

Blogroll

free counters

Minha lista de blogs